A condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro não ficou restrita ao noticiário doméstico. Repercutiu em Washington, Bruxelas e Pequim, onde investidores, diplomatas e analistas tentam medir até que ponto a instabilidade política brasileira pode afetar o comércio internacional, os investimentos e a imagem do país em fóruns estratégicos.
Nos Estados Unidos, parlamentares republicanos e democratas já falam em possíveis novas sanções contra autoridades brasileiras, ampliando o uso da Global Magnitsky Act, que permite congelamento de ativos e restrição de vistos a estrangeiros envolvidos em “corrupção ou violações de direitos humanos”. Para analistas, mesmo medidas focadas em indivíduos podem ter efeitos colaterais na economia ao elevar os custos de compliance e acender dúvidas sobre segurança jurídica.
“Se o Brasil continuar a ser visto como um terreno de disputa judicial e política sem regras claras, os investidores estrangeiros tendem a cobrar mais caro para aportar capital aqui. Isso significa juros mais altos, câmbio pressionado e dificuldade de captar recursos externos“, afirma o contador e professor universitário André Charone, mestre em negócios internacionais.
Tarifas já em curso
A tensão não é apenas retórica. Em agosto, o governo americano anunciou tarifas de até 50% sobre importações brasileiras, ainda que com exceções a setores estratégicos, como energia e aeronáutico. O gesto foi lido como sinal de desconfiança em relação à política brasileira e como parte da estratégia de Donald Trump de pressionar parceiros comerciais.
“Essas tarifas funcionam como um aviso: se houver deterioração institucional, mais setores podem ser atingidos. A agropecuária e a siderurgia estão na linha de frente, e isso pode afetar o preço dos alimentos e a competitividade das exportações brasileiras”, observa Charone.
Impactos diretos
Especialistas apontam três canais principais de impacto sobre a economia:
- Comércio exterior – Tarifas e barreiras reduzem competitividade e podem deslocar produtos brasileiros em mercados-chave.
- Câmbio e inflação – O real tende a se desvalorizar diante da fuga de capitais, elevando preços de insumos e importados.
- Investimentos – Empresas adiam ou cancelam planos diante da incerteza, aumentando o risco-país.
“É um efeito dominó: o dólar sobe, o custo das importações cresce, e o consumidor final paga a conta. Isso pode pressionar a inflação e forçar o Banco Central a manter juros altos por mais tempo”, explica Charone.
Europa e alternativas
Enquanto isso, a União Europeia tenta avançar na ratificação do acordo Mercosul–UE, que poderia servir como contrapeso à deterioração da relação com os EUA. Ainda assim, analistas lembram que a ratificação é incerta, especialmente com pressões de partidos verdes e agrícolas no bloco europeu.
Para Charone, o Brasil deveria acelerar essa agenda. “O país precisa mostrar que é confiável e que não depende de um único parceiro. Diversificar mercados e investir em diplomacia econômica é a melhor forma de blindar a economia dos humores políticos de Washington”, avalia.
Cenários
No curto prazo, três cenários estão no radar:
- Controle com desgaste – sanções individuais e tarifas pontuais, com impacto gerenciável.
- Escalada punitiva – ampliação tarifária e mais nomes na lista de sanções, elevando o risco de fuga de capitais.
- Acomodação parcial – diálogo diplomático reduz tensões, e acordos como o UE–Mercosul ganham força.
“O que está em jogo não é só a imagem do Brasil, mas sua capacidade de atrair investimentos e manter estabilidade econômica. O mundo observa, e cada gesto político interno tem hoje um preço global“, conclui Charone.
Sobre o autor:
André Charone é contador, professor universitário, Mestre em Negócios Internacionais pela Must University (Flórida-EUA), possui MBA em Gestão Financeira, Controladoria e Auditoria pela FGV (São Paulo – Brasil) e certificação internacional pela Universidade de Harvard (Massachusetts-EUA) e Disney Institute (Flórida-EUA).
É sócio do escritório Belconta – Belém Contabilidade e do Portal Neo Ensino, autor de livros e centenas de artigos na área contábil, empresarial e educacional.
Seu mais recente trabalho é o livro “Empresário Sem Fronteiras: Importação e Exportação para pequenas empresas na prática”, em que apresenta um guia realista para transformar negócios locais em marcas globais. A obra traz passo a passo estratégias de importação, exportação, precificação para mercados externos, regimes tributários corretos, além de dicas práticas de negociação e prevenção contra armadilhas no comércio internacional.
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